terça-feira, julho 20, 2004

SOBRE A PAIXÃO SEGUNDO MATEUS ou ESTE BLOG É MEU, SÓ LÊ QUEM QUER E NÃO OBRIGAMOS NINGUÉM

O mestre-de-capela Johannes Sebastian Bach compôs a Paixão Segundo Mateus em 1726 para ser executada na Igreja de S. Tomás de Leipzig, para oficiar uma única Sexta-Feira Santa. Trata-se de uma obra magistral para solistas, dois coros e duas orquestras. Há quem diga que é a obra mais bela de toda a música ocidental. Sem exageros hiperbólicos, é, de certa maneira, um símbolo desta própria civilização. O tema do libreto é a Paixão de Cristo, na versão de Mateus. O libretista, Cajender, segue o texto com fidelidade à Escritura na representação deste drama sacro. Os acontecimentos que antecedem a prisão do Cristo são representados pelos personagens dos solistas, enquanto que o coro representa, ora a multidão (como por exemplo na cena em que a turba exige a crucificação de Jesus em favor da libertação de Barrabás), ora, tal coro do ditirambo grego, tece comentários acerca da acção. De acordo com a retórica musical barroca, no qual Bach, aliás, era mestre, o objectivo era induzir nos ouvintes, quase maliciosamente, os sentimentos piedosos adequados. Outra questão, do foro mais musicológico, prende-se com a instrumentação a usar nas interpretações modernas. O uso de instrumentos da época, ou reconstruções fieis dos mesmos e as interpretações HIP [historical informed performamce] são actualmente o padrão. Autores como Frans Brugger, Phillipe Herreweghe ou os Gabrieli Player levam o nível de exegese neste domínio a limites, que o fundador deste movimento pró-autenticidade musical, como Harnoncourt, por exemplo nunca sonharam, arrisco. Esta obra foi apresentada ao público vienense por Félix Mendelson em meados do século XIX. O romantismo e o período musical clássico (escola de Viena) tinham grande aversão pela abstrusa música do barroco, que associavam ao Ancient Regime e desconheciam por completo. A Paixão, surgiu-lhes como uma revelação. De novo, as interpretações HIP levam o grau de exigência da reconstituição a limites artísticos tão altos, que existem gravações usando a instrumentação, orquestração e preceitos de interpretação que se querem próximos da versão de Mendelson.

Qual então, a instrumentação mais adequada? Ora, o Assento da Sanita tem outra teoria, que se apraz verosímil, no que respeita à instrumentação. Aconteceu há uns anos que um amigo me introduziu à maliciosa expressão “pífaro de dois papos” para designar o órgão de procriação masculino e a um possível uso menos ortodoxo do mesmo do ponto de vista da prática sexual. Foi uma iluminação. Bach era um proficiente técnico de órgãos. Construía e reparava estes instrumentos, tendo inventado vários registos que se tornaram norma nos órgãos barrocos. Nomeadamente, transpôs para o registo positivo do órgão o temperamento igual, que demonstrara já ser o mais adequado com o Das Woltemperiertklavier (o Cravo Bem Temperado). Eu sei que estão a apanhar uma grandessíssima seca, caros dois ou três leitores, caso ainda estejam a ler, mas a história mais provável é esta. Bach terá construído diversos instrumentos de dois papos. Tal facto parece ser sugerido no famoso caderno de Ana Madalena Bach. Vejamos, desfilariam o violino de dois papos, o oboé-de-amor de dois papos, o corne inglês de dois papos, o baixo de viola da gamba de dois papos, o fagote de dois papos, o órgão de dois papos e mesmo o cravo de dois papos. Ao que parece, tentou uma versão da invenção de Cristóforo de Pádua o gravicemballo col piano e forte (vulgo piano) de dois papos. No entanto não lhe agradou, pois praticamente não tem peças escritas para este instrumento. Assim, na Sexta-Feira Santa daquela tarde de 1726, os devotos luteranos que acorreram à Lepzig deparam-se com uma orquestra de dois papos que debitava a Paixão numa versão digamos…espermatorrêica. A fidelidade de execução exige pois, que se execute a Paixão deste modo.

Estarei a precisar de um reforço no lítio? De uns electrochoques? Não creio. Fora de brincadeiras, ouçam três versões: a do Herbert von Karajan que é completamente irrealista em termos de fidelidade época barroca, mas foi recriada por forma constituir uma peça notável; a do Phillipe Herreweghe (tem duas, uma de 84 e outra de 91, das quais a última tem uma clareza vocal notável) e uma das mais recentes dos Gabrieli Consort and Players dirigidas pelo Paul McCreesh (2003), que apesar de parecer um fanchono é um artista notável. Destaque para as peças vocais de mezzo-soprano, como por exemplo Erbarhme dich, Mein Gott, pela Madalena Kozená, que se estreia magistralmente neste reportório.

A minha versão “de dois papos”, teria como solistas, o Carlos Guilherme, aquele dos anúncios de congelados e do “quando o coração chora de amor” e tudinho instrumentos de dois papos. Não sei reconhecer uma pauta onde esteja escrito o “Parabéns a você”, mas acho que talvez o Ministério da Cultura atine. Olarilas.







sexta-feira, julho 16, 2004

“ME LIGA, VAI…”
 
[dedicado ao Bock].
 
- “Estou?”
- “Oi.”
- “É da Linha Sexo Quente, Húmido?”
- “É, gatão…que é que cê quer fazer? Já estou mexendo nos pêlos de minha bucetinha…Tô ficando húmida…mmmmhh…oh…fala comigo, vai. Tira sua sarda para fora e fala comigo. Tenho uma bundinha fôfa, que quer sentir o seu tarolo  me rebentando todinha. Me empurra o cagalhão até ao cachaço, vai. Mais…ah…”
- “Aham…fala o Bispo de Braga”.
- “…..”
-“Essa linha é cara, sô. Tem certeza que o Patriarcado pode pagar?”
- “Mas Alexandra, eu gostava de falar consigo. Acho que temos de conversar sobre o rumo que está a dar à sua vida. Mais concretamente, gostava de falar sobre o seu novo livro.”
- “Deve de haver algum engano. Meu nome não é Alexandra, Sr. Bispo”.
-“Tenho aqui o número que me deu os Sr. Ministro do Trabalho e Solidariedade Social. Há aqui uma questão sobre quem recebe os direitos de autor. Aparentemente não conseguimos o número de identificação fiscal do Autor. Ele anda a ser pressionado pela ministra. E agora, já que vai ser Ministro das Finanças, quer entrar com o pé direito. Só pode estar certo, o número. Não há engano.”
- “Seu Bagão? Ah…me lembro dele. Tive de fingir que introduzia umas linguiça e umas morcela. Sujeito esquisito esse, sô. Perdão, seu Bispo.”
- “Bom. Mas a senhora não é a Alexandra Solnado?”
- “Deve ter havido troca de número. Pergunta para ele.”
-“E agora? Bom, deixe lá isso. Que tu tens vestido minha filha?”
- “Er…eu nada. Estou pelada, esfregando o telefone na minha buceta húmida e que te deseja com ardor….mmmh….que tesão … oh….seu Bispo, ah…que grosso. Vou introduzir o bucal do (…schloc).
-“Está? Está lá? Ó Bagão, só ouço uns ruídos esquisitos, escuta lá…”
-“Schloc…schloc…schloc….schlocmfrllll…squik…smnfrr…squik…schoclml…schoc….”.
-“ Alexandra? Filha….”
- “Schloc…schloc…esmifr…prrrlllll…..prrrlllll….(abafado) aaaaaahhhhh….”.
-“Oi. Gostou seu?...er. Como é seu nome mesmo?”
- “Bispo”.
-“Isso”.
-O que estavas tu a fazer, minha filha? Tu és uma alma tresmalhada. Vem ter cá a casa para falarmos”
- “Eu, hein? Vixe, tenho o bucal colando no cigarro. E cheira a maresia…Sua casa? Pode ser. Você gosta de mulher gordinha.”
- “Não faço distinção no meu rebanho. Somos todos filhos de Deus.”
-“Er…você gosta de mulher mais velha?”.
-“Depende…quão velha?”.
- “Bom, para ai uns 67. Não me lembro bem. Acho que o AIDS me está afectando a memória”
- “….”.
- “Seu Bispo?”
- “Sim. Pode ser. Já não vejo o padeiro há tanto tempo, Alexandra. E depois sonho consigo todos os dias. Até já tenho um buraco no colchão. Ah,… e o perfume do seu livro… E o prefácio do comuna do Frei Bento Domingues? Que homem…, que naco! Dá-me cá uns arrepios nas costelas flutantes…Mas também  tenho a sua fotografia mesmo por baixo do terço de cápsulas de eucalipto e rolhas de cortiça com um Cristo fluorescente, que comprei no "fatimashop"( http://www.fatimashop.pt). Até já mandei arredondar aquela parte dos pezinhos para não ficar com o cú quadrado”
-“Seu Bispo?”
-Diz, minha gazelinha ultramarina, minha mulatinha serôdia, minha Gabriela da Telecom, minha… (suspiro). Pronto. Falei no Domingues, está tudo estragado, já não consigo. Ai, aquelas camisas Triple Marfel e aqueles pull-overs Lacoste da feira. Aquela marrafinha feita com petróleo Olex e aqueles óculos de massa. E aquela pochete tão sexy? (suspiro). Mas diz lá. O que queres saber, minha filha?”
- “Seu Bispo…”
- “Sim?...”
-“O que são costelas flutuantes?”
 
FIM







terça-feira, julho 06, 2004

PORTUGAL EM ACÇÃO

A tendência para a grosseria dos portugueses é atávica. Não há nada a fazer. Assim por exemplo, à aldeia de Cabeção no Alentejejo chega-se por uma estrada ladeada por um muro onde alguém inscreveu o grafitti “CONA, PUTA, PICHA” em letras garrafais brancas. Decidiu suavizar o final da frase com “picha”, que sempre é menos ordinário. E ainda lá está. Passo por lá, uma ou duas vezes por ano e este austero manifesto continua na parede. De qualquer modo, existem outras manifestações artísticas dignas de nota na referida localidade. Há, uma pequena pirâmide pontiaguda, feita de desperdícios de mármore que é, tão só, um monumento á terceira idade. Está-se mesmo a ver os idosos que ainda consigam atingir a metáfora subtíl do artista, a ficarem contentes por, em primeiro lugar serem tratados como múmias e em segundo lugar por se tratar de um monumento funerário. E a relembrar-lhes que o destino próximo deles é ocuparem uma morada equivalente. Ou seja, não tarda nada estarem a comer alfaces pela raíz e o Estado a poupar os tostões da pensão deles. Só falta uma frase lapidar na base da pirâmide a dizer “A todos aqueles que já estão a dever uns anos à cova”. É do caraças. Mas isto sou eu que tenho uma tendência natural para, maliciosamente, imputar segundas intenções. A atitude é a mesma. É com o coração nas mãos que alguém pinta a parede com ordinarices gratuitas e faz um monumento aos seus venerandos velhinhos. É a dizer, “nós honramos as nossas raizes, mas aqui não acontece nada! E puta que pariu, que a malta o que quer é agasalhar a morcela”. E o resto são cantigas.

Viva o portugês que escreveu o “cona, puta, picha”na parede. Afinal de contas também conseguimos ser um povo ordeiro e bem educado. Já me viram ali os adeptos de diferentes equipas misturados ad hoc no estádio, em salutar convívio desportivo sem se pegarem á sarrafada? E a beberem copos uns com os outros enrolados nas respectivas bandeiras no Rossio. E as raparigas portuguesas com o braço por cima do ombro dos holandeses, tão tristinhos. É bonito. É Portugal em Accão. Nós somos assim.