quinta-feira, setembro 30, 2004

TENTAÇÃO
[script para um Tarentino português]

Naquele tempo, Jesus estava no deserto há já quarenta dias e quarenta noites. Nisto surgiu o Diabo, que meneava a forquilha e se aproximou de Jesus com falinhas mansas.

DIABO – Môm. ´ta-se bem?
JESUS – ´Tá-se. É aquela. ´Tásh a ver?...
D.- Ya.
J. – Ouve.
D. – Arranjas-me aí uma mortalha?
J. – Ya, môm. Toma.
D.- Tens uma beca de cartão para fazer um filtro?
J. – Ya. Toma.
D. – E não representas um cochinho de chamôn?
J. – Ouve. Represento, môm.
D. – Tu és um bacano, môm.
J. – ‘Tá-se bem.
D- (enquanto enrola) – Então tens uma garina?
J. – Mais ou menos. Ela anda sempre atrás e mim, tásh a ver? Mas eu não sei. Esta coisa do meu Pai…e ela anda no fanico. Faz cabritos, tásh a ver? Se calhar ainda apanho alguma doença marada. Não sei bem se curta com ela. Ela diz que eu sou fôfinho e que nem preciso de tirar senha, mas é uma cena munta marada. Aqueles madieus todos ali a malhar na fenda da garina...
D- É uma que parece a Cidália Moreira, a “Cigana do Fado”, que aparece naquele cartaz do “Evangelho segundo Jesus Cristo?”.
J. - (inala com força e retém a respiração. A voz sai um bocado sumida e esganiçada) – É. Mas essa era casada com o Professor Karma, aquele barbudo que é hipnotizador.
D- Hipnotizava galinhas não era?
J. – Era. Uma vez levou uma bicada no nariz.
D- Ouve. Que cena! No nariz. Mas ela cantava aquela música do “bacalhau quer alho”, não era?
J. - ´Tás a confundir. Esse era o Pequeno Saúl.
D- Eu conheço um Saúl. Trabalha nas Finanças.
J. – Não conheço.
D. – Ele diz que te conhece.
J. – O que é que estavas a dizer? Esta merda ´tá a bater como o caraças.
D. – Ya. Este não é da farmácia.
J. – Ya. É aquela. Uma vez vi-o num Circo.
D- O Saúl trabalhava num circo?
J.- Não, o Professor Karma. Mandou a assistente arrancar cabelos da cabeça de uma espectadora e depois adivinhou quantos cabelos eram.
D. – Ouve, ganda nóia.
J. – Era chavalo,grisei-me todo.
D. – Se calhar disse um número ao calhas, não?
J. – (atrapalhado) - Ouve! Qual é a tua, môm? Não foi nada. Foi mesmo telepatia, caralho!...
D.- ´Tá-se bem, môm. Qual é a tua? Como tu eras chavalo se calhar confundiste. Acontece. Enrola aí outro.
J. – Uma vez confundi-me por causa duns snifs de Benzovac e fui-me à alfarrobeira da minha avó e comi baita alfarrobas.
D- Isso dá moca?
J. – Não, mas andei sem cagar três quinze dias. Tiveram que me meter um talo de couve.
D- Onde?
J. – Na tripa cagueira.
D- ´Da-se. Cum caralho. Doeu?
J. – Nem por isso. Até curti.
D.- Er….curtiste, foi. (pouco à vontade).
J. – Sempre é melhor um talo de couve que uma rolo de pintura.
D. – Pois. (Olha para o relógio).
J. – Ou um nabo…
D. – Que giro.
J. – Ou uma Nossa Senhora fluorescente…
D.- A tua cota é fluorescente?
J. – Ela não. Mas vi um gajo fluorescente o outro dia.
D.- Ouve que cena! Um gajo fluorescente!?!!...
J. Era um velhinho de barbas brancas. Disse que era o meu pai.
D. - ´Da-se, que cena? Mas o teu pai não é o Sô Zé da carpintaria?
J. – A minha velha é dada ao convívio. Não sei. A psicóloga lá da Escola diz para eu não pensar muito nisso.
D. – Andas na psicóloga? Er…que cena fora…, digo fixe.
J. –Achas que eu sou marado?
D. – Eu? Não! E como é que era esse velhinho?
J. – Tinha um saco de plástico com uns peros “Golden Delicious” e umas carcaças.
D- Se calhar era desses que vende a Cais.
J. – Não sei. Não tinha colete e tentou-me vender a Eva do Natal.
D. – Natal? O que é isso.
J. – É uma brincadeira lá de casa. Dizem que nasci numa estrumeira com vacas e burros.
É uma história complicada. A psicóloga é boa como o milho.
D. – Milho? O que é isso?
J. – Uma merda americana que se come.
D. – Americana? O que é isso?
J. – Foda-se meu! ´Tás parvo, ou quê?
D. – Eu por acaso gostava de experimentar essa cena do talo de couve.
J. – Também gostas dos Soft Cell?
D. – É uma cena bué antiga, mas curto bué.
J. – Hum…bute conviver ali para trás daquela sarça.
D. – Sarça? O que é uma sarça?
J. – Tenho aqui vaselina. Deixei-a cair na areia o outro dia. Andava à procura do limão.
D. – Vidro moído era pior. Bute lá.

FIM














quinta-feira, setembro 23, 2004

ATENÇÂO: ISTO NÂO É PARA LER. PURA DIARREIA VERBAL.

O petiz terminou as sopas de cavalo cansado, com um copo de três a acompanhar e levantou-se da mesa. Tropeçou no pai que estava a coser a bebedeira caído no chão da barraca. A irmã tinha sido resgatada pela Capitania, já meio a caminho de ir a nado para o barco do aborto, pois não sabia qual dos rapazes africanos com que tinha convivido na rave dos bombeiros seria o responsável. O petiz lá foi para o seu turno de dezoito horas de coser ténis adidas. O pai acordou e arrastou a garrafa de oxigénio, que usava por causa da asma para cima da mãe, que tinha quatorze anos e vomitou-lhe em cima os feijões de lata do almoço. Era a experiência sexual mais intensa que tinha nos últimos meses. A última tinha sido quando om pai tinha trazido os amigos para ver o futebol e beber cerveja e a mãe teve de fazer uma geraldina.

Lá em Braga as pessoas eram muito católicas e não viam aquilo com bons olhos. Um bibliotecário itenerante da Gulbenkian, que perseguia magalas e tratava menos bem a família era de desconfiar. O passatempo favorito dele era encher garrafas de mijo e pô-las nos cestos de papeis públicos para os funcionários da câmara levarem com eles nos pés quando fossem despejar.

Tinha amigos mas já não se viam há muito tempo. Um deles era um pintor que vivia no Alentejo e se embebedava de forma hiperbólica. Uma vez apanhou o autor destas linhas numa esplanada dum café e esclareceu-me que somos todos filhos "dum cuspo". Esta imagem é nojenta, eu sei, mas são assim os nosso artistas abjecionistas passados do prazo. Voltei a encontrá-lo e relembrei-lhe a seca que me tinha dado há uns anos. Ainda se lembrava. Talvez por eu ser um rapaz ainda bem apessoado. mas por falar em bem apessoado. Quem tem um péssimo aspecto é o Ministro do Ambiente. Que beto inútil! Que pseudo-aristocrata falido, degenerado pela consaguinidade! E aquela marrafinha? E a camisinha ás riscas Rosa e Teixeira? Nunca deve ter feito ou aprendido nada na vida! Agora a corja de meninos-da-linha que acham "giríssimo aquilo do ambiente"; o refugo da classe política chegou ao poder! papa-óstias!

Pronto. Eu avisei. Isto era só para despejar um certo fel. A referência ao Luis Pacheco não sei de onde veio. Por acaso acho uma merda tudo o que escreveu. Haja saco para ele e para os amigos surrealistas e abjecionistas "enfant-terrible-paneleiros". Merda por merda, lembrei-me do Ministro.

A bem da Nação.

A.

terça-feira, setembro 14, 2004

UMA CONVERSA EM FAMÌLIA

Sou ainda do tempo dos televisores a preto-e-branco e lembro-me muito bem da figura esquálida do Professor Marcelo Caetano e das suas sonsas, insidiosas e paternalistas “Conversas em Família”. Pior só mesmo o “TV Rural” e o programa do Pedro Homem de Mello sobre folclore. Apesar de ser uma memória vaga, também me lembro do Dr. Oliveira Salazar, com o seu nariz adunco e a voz tremidinha a debitar, qual paizinho, os conselhos de siso e condescendência para o Povo parco em ideias e responsabilidade, acerca do seu próprio destino. Confesso que o Bagão, ontem, me pareceu uma imitação barata dos dois, com o seu fato cinzento antracite e ar de Dr. Septimus do Blake e Mortimer. Discurso simplista para enganar simplório e a roçar o fascizante aparte, há uma afirmação completamente irracional e inaceitável num estado moderno. Trata-se do falacioso princípio do “utilizador-pagador”. Assim, por esta lógica perversa, seria injusto que os transmontanos pagassem, dos seus impostos, uma via rápida no Algarve, pois a probabilidade de a virem a usar frequentemente é praticamente nula. Deste modo, que a paguem os algarvios. A ideia de bem comum é alheia a este discurso. Mas então pressupõe-se que investiriam dos seus impostos, em infra estruturas, apenas os cidadãos transmontanos nas estradas de Trás-os-Montes. O seu a seu dono. É um bocado como o condomínio dum prédio pagar o elevador. Se um algarvio vier a Trás-os-Montes, é certamente para visitar um transmontano e pronto, não se vai cobrar por uso tão esporádico. É uma atençãozinha a um visitante. No entanto, o dinheiro disponível na hipotética via rápida é proporcional ao Produto Interno Transmontano (chamemos-lhe assim) e não há-de ser muito, comparativamente ao de Lisboa e Vale do Tejo ou do Grande Porto, por exemplo. Aplicado o princípio baganofelício, o mais provável era os transmontanos ficarem com os seus caminhos de cabras, por não terem dinheiro para muito mais (por serem pobres e poucos) e as vias rápidas ficarem concentradas nos grandes centros populacionais do litoral, pois os cidadãos destas área são mais em número, pagam mais impostos e existe infinitamente mais industria e serviços. Justo, hem? É advogar o regresso à lógica tribal, ou quê? Acho que é outra coisa. Trata-se de, novamente, vender o discurso facilista e trauliteiro da falência do Estado e da incapacidade que este tem para gerir os bens públicos. Não que não seja verdade, mas note-se que a falta de recursos do Estado é relativa. Claramente, disse o Beato Bagão, quase de mãozinhas postas, que o dinheiro não chega para a Saúde nem para e Educação. Não chega de facto para nada na Administração Pública, pois os orçamentos foram rebaixados ao ponto da paralisia total, na minha opinião, para enfatizar a incapacidade do Estado. Os amigos da do Bagão da Opus Dei, esfregam as mãos de contentes e afiam os dentes preparando-se para gerir lucrativos hospitais, pontes, escolas, etc.,que construídas com dinheiros públicos, lhes são dadas de mão beijada. Bom. Levar-nos-iam muito longe as implicações destas cogitações e como não quero aborrecer mais os meus caros dois ou três leitores, remato dizendo que não me parecem alheia às dificuldades orçamentais públicas coisas como as compras de Audi A8 para os novos ministros e secretários de estado assim que tomaram posse; as nomeações em catadupa em Agosto, quando o vulgo está a banhos? Quem apela à moralidade, enquanto nos passa atestados de imbecilidade? Os beatos-opus-félix? Haja estômago.Desculpem o discurso vagamente político, mas hoje não estou com paciência para escatologias.

Do vosso,

Assento da Sanita