terça-feira, dezembro 21, 2004

UM CONTO DE NATAL

Ebeneezer Scrooge era um tipo muito antipático, rezingão e avarento. Não suportava a quadra natalícia. Era cá um enjoo…consumismo, desperdício e um mero golpe comercial desprovido que era já, do sentido sagrado de antanho. A caminho da loja de penhores cruzara-se com uma menina que tiritava de frio na rua e tentava vender fósrforos aos transeuntes e a quem ele dera um pontapé. Ebeneezer tinha ido ao mercado rabiscar os talos de couve e os nabos bichados para uma sopa, que iria comer sozinho no Natal, enquanto veria o Canal 18. Uns rapazes faziam um peditório para a Operação Pirâmide junto a um Pai Natal sebento e com uma barba de algodão higrófilo e que era tão só um agarrado a quem o Charcutaria Meireles, que ficava ao lado da loja de Ebeneezer, tinha pago uma quarta [um quarto de grama de substância semi-adulterada com Leite Molico, contendo vestígios de cloridrato de heroína, na gíria dos toxicodependentes], para fazer festas nas crianças e dizer “Oh, Oh, Oh, compra aqui um chouriço, senão levas no toutiço”. Ebeneezer mandou o Pai Natal para a puta da mãe dele, deu a volta á chave e entrou. Guardou as cascas de ovos, as escovas de dentes usadas e um safa-calos já gasto no monte de lixo que acumulava por toda a casa. -“Nunca se sabe quando estas coisas vão fazer falta e não se pode desperdiçar nada” – era o seu lema desde que os bombeiros, alertados pelo mau cheiro, entraram lá em casa da ultima vez.

Scrooge deitou-se num sofá já puído e com algumas molas de fora, a roer o talo da couve enquanto chupava um espinha de bacalhau que guardara do mês passado. Pegou no comando e ligou o televisor Telefunken a preto-e-branco. Apareceu um programa retrospectivo do Fialho Gouveia. Mudou de canal. No canal 18 estava um grupo de senhoras entusiasmadas com um rapaz de côr, um pastor alemão e um Pai Natal bastante avantajado. Estavam desembrulhar as prendas que eram basicamente pepinos taludos e uns rábanos gigantes que não demoraram a introduzir nas partes naturais com gemidos profissionais. – “Ooohhh…mmmmm….mais fundo…Que grosso….brml…” Uma delas evacuava na barba do Pai Natal enquanto a outra se esfregava na árvore ricamente decorada com bolas coloridas e luzinhas. As pálpebras de Scrooge começaram a pesar. Começou a sonhar que estava sentado no sofá a ver o canal 18, a chupar um talo de couve e uma espinha.

FANTASMA – “Aham…”

SCROOGE – Aaaahhhhh!!!!...caralho! Foda-se que susto! Quem és tu?!!...”

F. – “Eu sou o fantasma dos Natais passados. Lello, para os amigos…ai.”

S. – “Se é para a merda da Operação Pirâmide, não dou. Que se fodam os pobres.”

F. – “Não. Vem comigo, pois vou-te mostrar como tens sido um safardanas, um calhorda, biltre, um svandija, um crápula, um pulha, um velho avarento e a cheirar a mijo, um palhaço, um ganda paneleiro e pouco amigo do seu semelhante. Por isso és um homem solitário, Scrooge….”

O fantasma tinha uma barba preta, um chapéu sebento e uma alcatifa enrrolada debaixo do braço.

De repente, Scrooge e o fantasma estavam a ver Scrooge em criança a ajudar a mãe e fazer o Presépio.

SCROOGE PEQUENO – “Ó mãe, falta a vaquinha. Ainda só puseste o marido, o S. José.

MÃE DE SCROOGE – “Deixa lá isso. E isto…é o quê?”

SP. – “Er…uma larada do camelo do Baltazar…”

MS – “Ó filho, mas ocupa a manjedoura toda. E está a tapar o Menino Jesus. Onde é que foste buscar isso. É de barro?”

SP – “Não. Fiz.”

FANTASMA – “Estás a ver Scrooge? É preciso continuarmos? Sempre foste um palerma, homosexualão, tinhoso, uma criatura desprezível, um monte de lixo, uma pústula infecta, um cagalhão com sangue ambulante, uma pasta viscosa e purulenta. Tsss… tsss. O Menino debaixo duma poia. Francamente.”

Scrooge acordou assarapantado e estava já o Fantasma dos Natais Futuros ao lado dele.

S. – “Aaaaahhh!!!!.... Foda-se, Cona da tia! Quem és tú?!!! Que susto…. Um fantasma duma pôrra de Natal qualquer, não?”

FANTASMA II – “ Isso, meu irmão. Dos Natais Futuros. Instrutor de Step nas horas vagas. Vamo nessa?”

O Fantasma era um fulano mulato parecido com o vocalista dos Terra Samba, com uma camisola de alças amarela de lycra e uns calções côr-de-rosa muito justos.

O fantasma mostrava Scrooge na fossa séptica do Asilo do Pisão a mascar uma ratazana morta há quinze dias, inchada e sem pelo. Dizia um dos internos, todo desdentado, cá de cima, a rir-se:

INTERNO – “Ui, Scrooge cabrão! Caga no sapato! Mija na agulha! Em muy hieramá vieste cá parar… És um patife! Quem tem farelos? Vai passar o Natal com o caralho! Ficas aí na fossa, que te fodes, caralho, foda-se, puta que pariu!”

Scrooge ao ver isto, arrependeu-se sinceramente de ter sido um avarento, sovina, monte de esterco, molusco paneleiroide, punheteiro, bimbo, travesti, numerário da Opus Dei, facínora e biltre.

SCROOGE – “Daqui em diante, vou ser magnânimo, assertivo, espiritual, compassivo e terno com os animais e as crianças. Vou doar a minha fortuna à Casa do Gaiato e soltar os ucranianos que tenho presos na cave. Vou fazer uma Fundação e alimentar os golfinhos do Sado e mais os linces da Malcata!. (canta com sotaque brasileiro) …Eu vou ouvir…Obrigado, Senhor, pelas estrelas!...E as baleias nos mares!...O meu calhambeque, pi, pi. Vou comer o meu calhambeque, pi, pi…”

FANTASMA II – “Passou-se. Ora pôrra.”

Voltou as costas e atravessou a parede.


FIM






quinta-feira, dezembro 16, 2004

GO WEST

(Do baú, datada de 26/01/94)

I

Sundance Kid virou-se para o lado e disse:
- “Como é que querias que eu adivinhasse?”
Butch Cassidy olhou-o de soslaio e afagou o seu calibre 45. Cuspiu uma enorme bola de tabaco de mascar para a bacia de esmalte e atalhou:
- “Não se anda para aí a enrrabar pessoas que se encontram bêbadas, caídas de borco na selha de água dos cavalos…
Sundance Kid ficou um pouco embaraçado e cofiou a barba de três dias. Pela janela do Hotel Catus Cross entrava um sol forte e alaranjado. Suspirou e finalmente disse:
-“Desculpa lá. Não sabia que eras tu.” E ajeitou-lhe os pachos quentes no anús roxo e tumefacto.

II

Águia Incontinente seguia as pegadas frescas dum búfalo na pradaria infinita. No pôr-do-sol recortava-se uma sombra. Pôs a mão em pala para ver melhor. Não. Não tinha a certeza. Mas não; era o velho Bill O´Brian. O velho mineiro aproximou-se vagarosamente de Águia Incontinente.
- “Olá filho”. –Disse o velho O´Brian.
- “Olá, querido”. –Disse Águia Incontinente.
-“Olá, amor”- Disse um búfalo que se aproximara sorrateiramente deles.

III

A caravana de vagões arrastava-se como uma serpente, lenta, pelo deserto do Mojave. A Califórnia esperava por eles. Mas não ia ser fácil. O velho Quaker afagou a crina do cavalo. A companhia dos telégrafos já andava a espalhar postes pelo deserto. Um mórmon descobriu umas pedras debaixo de uma árvore. Uma diligência da Wells Fargo cheia de buracos de bala, atravessa-se-lhes à frente. Um cigano vendedor de elixires aproveitou logo para vender umas coisas. O velho Quaker tirou a boca da verga do cavalo para beber um golo de elixir. A mistura de elixir com o esperma abundante e copioso do cavalo reagiu com violência, por ser uma reacção exotérmica. O Quaker explodiu e abriu-se uma grande racha na pradaria – O Grande Canhão.




TURISMO

Um estrangeiro loirinho foi enganado por um cigano, comprando um galo de Barcelos por 18 contos. O galo era normalíssimo, feito de barro e mal pintado. Era, em verdade, um porta-chaves ordinário e sem graça. O estrangeiro, a seguir, comeu uma sardinha por 650 escudos e comprou uma Nossa Senhora que mudava de cor com a humidade. A seguir, decidiu experimentar uma prostituta portuguesa e quando chegou ao quarto foi enrrabado por dois ciganos. Quando saiu pediram-lhe uns trocos e ele deu dez contos. A seguir foi a Cascais e comeu um pastel de bacalhau feito de batata e comprou um boneco feito de conchas de búzio coladas. A seguir tirou uma fotografia a um cigano que andava a vender relógios Rollex por três contos e foi para a Suécia. Lá mostrou a fotografia dum português típico, embebedou-se e foi receber o dinheiro da Segurança Social.


TRÊS HISTÓRIAS DE NUMERÁRIOS

Um GNR estava a fazer um autostop e mandou parar um gajo da Opus Dei. Este estava com vontade de cagar. Arreou as calças ao lado do GNR e cagou abundantemente. A seguir, rasgou umas páginas do Livro dos Actos dos Apóstolos e limpou o cú.

Um gajo da Opus Dei entrou num banco privado e depositou 50 contos na conta “Abraço a Moçambique”. A seguir acordou a tremer, cheio de suores frios.

O esperma seco acumulava-se no pénis insalubre do cão tinhoso. Uma gaja da Opus Dei chupou-o com gula e os olhos do cão entraram pelas órbitas adentro.




TOTUS TUUS

O Papa vestiu-se com um fato de treino roxo e verde, calçou os ténis e saiu.
Na capela de S. Pedro, as mulheres da limpeza puxavam o lustro ás colunas de Bernini quando Sua Santidade entrou. Não o reconheceu e continuaram. Uma delas introduzia um grosso círio na cenaita, besuntada previamente com os Santos Óleos. A outra rostia abrutalhadamente a bernarda piolhosa com um fémur das relíquias de São Tomás de Aquino.
O Papa mirava tudo aquilo num frémito de excitação e “Mas não sei se por ironia ou por capricho; Quis-se vir (…); mas em vez de alva langonha; rebenta-lhe do cú, merdoso esguicho”. (1)

[(1) J. M Barbosa du Bocage].







sexta-feira, dezembro 03, 2004

RETRATOS DA URBANIDADE I

(N.A. - Dos manuscritos assênticos de 09-06-1993. Estes escritos não são particularmente interessantes. Tratam-se de ligeiras distorções da retalhos da realidade vivida pelo A., quando era estudante e ia de comboio, eléctrico, autocarro e metro. Mais, as referências étnicas, etárias ou sociais são apresentadas factualmente sem qualquer tipo de juízo de valor ou desmerecimento.). É também fruto da liberdade literária o uso do pseudónimo dum genial grupo de matemáticos para o personagem urbano-depressivo. O desenho também é original.

Nicholas Bourbaki passeava ao longo da Estação do Metro com o seu sobretudo cinzento abotoado até acima.

23:51:03: Evita uma escarreta.
23:52:24: Um cigano pede-lhe uns trocos.
23:52:27: Nicholas Bourbaki troca as suas botas da tropa por um panfleto de pó.
23:53:01: Um pregador da Igreja Maná acaba finalmente por convencê-lo à conversão arrastando-o pelo garrote.
23:53:03: Um velho que se mija pelas calças abaixo olha-os de soslaio.
23:53:37: Nicholas arreia um enorme pontapé na máquina de dispensar fritos da Matutano, pois já estava a tentar havia um bom bocado.
23:53:39: O velho arreia as calças para baixo e defeca no meio da carruagem.
23:53:40: Um ceguinho pisa o cagalhão.
24:00:00: Nicholas olha enjoado aquela cena e cola decalcomanias no vidro da porta.
02:23:01: Um preto comenta com Nicholas que se calhar passa-se qualquer coisa com o Metro.
02:23:15: Nicholas, nos lavabos da estação dos Anjos retira um indivíduo que estava caído de bôrco no urinol, para poder aliviar a bexiga. Era o pregador Maná.
06:50:32: Nicholas dorme, embriagado com Bols –licor de ovo, junto a uma velhota andrajosa cujos braços são uma crosta dos pulsos até ao pescoço. A velhota confessa-lhe ter 23 anos. Emocionado, Nicholas abraça-a contra a porta do “Ás-do-Livro”. A velhota, sem querer entorna a arrastadeira.
08:50:17: Nicholas Bourbaki vai até ao Solmar comer umas pataniscas de bacalhau.

RETRATOS DA URBANIDADE II

Um grupo de pretos corre atabalhoadamente e com grande alarido pelos corredores de um comboio. Uns metálicos olham enfastiados enquanto rasgam um banco. Um passageiro é projectado pela janela por um revisor em fúria.
Dois polícias beijam-se no furgão.
- “Hum. Que belos tomates tens…”- Diz um deles ao outro.
- “Os teus também não são de se deitar fora.”
Deitam-se sobre as inúmeras seringas que estão no chão e amam-se furiosamente.
Os pretos subiram para o tecto do comboio e brincam com a catenária.
Os metálicos puxam o alarme e saem entre a Damaia e a Amadora. O maquinista desata o garrote e persegue os metálicos. Um brasileiro consulta os astros enquanto espera que o comboio arranque. Sete suicidas esperam, impacientes, o comboio que nunca mais chega. Cai uma catenária e um cigano morre electrocutado.
Preparam-se transportes alternativos. Uma bicha de 1500 pessoas aguarda os alternativos. Um bêbado protesta contra o Cavaco e ninguém liga. Os alternativos seguem e atropelam sete pessoas. Os suicidas sentem-se ultrajados e consultam o horário do dia seguinte.
O sol nasce e um preto cai dum andaime. Salva-se graças ao penteado excêntrico que usa e actua como pára-quedas.
Filas intermináveis de pessoas a maldizer o Governo, os empregados da CP e os pretos, suspiram pelo Salazar. O altifalante anuncia que a circulação se encontra interrompida entre a Cruz da Pedra e Campolide, por motivo de 7 atropelamentos.

RETRATOS DA URBANIDADE V

Num eléctrico, uma velha conta como a neta foi ajudada num exame de código por uma mão invisível. A vizinha chucha num crucifixo fosforescente enquanto acena de aprovação. Saem no Campo Santana e descarregam uma sacada de perninhas de cera em volta da estátua do Dr. Sousa Martins. A velha beija um retrato bolorento do Padre Cruz. Visitam várias agências funerárias, fazendo revirar os estabelecimentos do avesso, em busca de um rosário de rolhas de cortiça, para pôr na cabeceira da cama. Acabam por sair com um rosário de cápsulas de eucalipto e uma transladação de brinde.
A velha conta como a cunhada foi salva por uma mão invisível quando ficou com a cabeça entalada na máquina de lavar roupa. Benzem-se e vão assistir a um desastre de automóvel onde os passageiros ficaram reduzidos a uma papa. São assaltadas por uns jovens de botas de bico e cabelo à futebolista. Gritam “ódaguarda” e a GNR chega duas horas e meia depois. A velha estava estendida no chão com uma síncope cardíaca. Um jovem de meias brancas e gravata de napa tenta ajudá-la. O GNR pontapeia o jovem na cabeça e na boca. A mais nova explica o sucedido e que o rapaz é inocente. O GNR toma conta da ocorrência e vai-se embora. A velha morre, mas ressuscita logo a seguir, graças à intervenção do Dr. Sousa Martins.

RETRATOS DA URBANIDADE VIII (Um ecossistema).

Uma rapariga de 13 anos foi seduzida por um ciganão de fato-de-treino, com uma “box” ao ombro. Contra a vontade dos pais, juntaram os trapinhos e foram viver para uma barraca de chapa zincada numas hortas. Tiveram dois filhos. As crianças ranhosas brincavam nuas da cintura para baixo num alguidar com um talo de couve tronchuda. A mãe teve de lhes rapar a cabeça por causa da tinha e das crostas. A mais pequena, a Kátia Dúnia Soraia, com a fome, chupava os limões que o pai deixava espalhados por todo o lado na barraca. As ratazanas comiam os dejectos das crianças e serviam de entretenga para a mãe que se divertia a atirar-lhes com as galochas.
Quando o esterco já lhes chegava aos joelhos, resolveram mudar-se para a casa dos pais dela, com as crianças. Quando chegram lá, a mãe estava paralisada numa cadeira-de-rodas e o pai, que era GNR, tinha dado um tiro de caçadeira na cabeça, porque tinha uma amante que fugira com uma ratazana.

UNIVERSIDADE DA CURRALEIRA
FACULDADE DE PSICOLOGIA
Programa:
1. – História e Sistemas da Psicologia Cognitiva
2. – Watson e o behaviourismo.
3. os estudos de Pavlov.
4. O pensamento do Prof. Karma.
5. As investigações de Zandinga I
6. As investigações de Zandinga II.
7. Seminário.

RETRATOS DA URBANIDADE IX

Imaginem o seguinte personagem:
- fato de treino roxo e verde brilhante; panamá branco na cabeça; bigode farfalhudo; meias turcas brancas e chinelos de ir à piscina.
Tem uma esponja na mão e um balde de água com detergente na outra. Este homem trabalha no BCP. Tem um cão gordo, com as patas afastadas e é chato por cima. A mulher tem uma T-shirt grande com um nó de lado e o cabelo loiro platinado com as raízes pretas e veste calças colantes da feira, saltos altos e óculos escuros dos monhés.
O filho limpa a seringa com óleo de cedro. O cão lambe os tomates. O homem lava o Seat Marbella. A mulher lava a cona com Super Pop Limão. A avó parkinsónica engana-se e põe a placa dentária na cenaita.
O filho dá um caldo de aguarrás. A mulher faz a sopa com os collants e couve tronchuda. Guarda do talo para pôr na cenaita, logo à noite.
O homem encera o seu Seat Marbella.
A avó mastiga em seco, em frente ao televisor, enquanto vê o Artes e Letras.
O cão mija na Diffembachia da sala de estar e olha desconfiado o dálmata de loiça ao seu lado. A mulher arreia uma sova no cão com um talo de couve recentemente retirado do anús.
O homem está a polir as jantes com Cif amoniacal. A avó mija-se pelas pernas abaixo em cima de uma alcatifa roxa de pêlo alto, na sala.
O filho dá um caldo de Forza-desentupidor-de-canos. O cão estrebucha num estertor com um talo de couve tronchuda no anús. A mulher tira-lho de repente com um “poc” seco e o cão desaparece a ganir.
A avó e o filho trocam seringas e dão um caldo de óleo de rícino. O homem pontapeia o cão, porque este agora sofre de incontinência fecal e borrou-se nos estofos da frente.
A mulher lê a Maria e fica a saber que o sexo em grupo faz bem às supra-renais, à celulite. Se for com pretos faz subir a tensão arterial mas baixa o colesterol. As prolactinas são indiferentes a esta prática.
A avó e o neto partilham as seringas com um bando de ciganos, que entretanto se mudou lá para casa, aproveitando a ausência do Chefe de Família. A mulher lava a loiça, enquanto chucha, distraída, num talo de couve tronchuda. O cão lambe os tomates a um cigano, que pouco habituado às comodidades da civilização, se lavara por baixo, por engano, com Whiskas, no aquário da sala. O cão roda toda a tribo até que se fartam dele e o dão a um ciganito ranhoso que se entretém a introduzir-lhe a própria cauda no recto. O homem cola um Haze bo tablier do carro. Um cigano vai ao cú ao filho, a troco de pó marado, enquanto a avó faz um minete a uma cigana, sem razão especial. A mãe mete um rábano descascado e untado com banha na cenaita. Um ciganito tenta vazar um olho ao cão, que escapa por um triz, escondendo-se no micro-ondas.
O homem aspira os tapetes do carro.
Um cigano enrraba a avó e faz um broche ao filho que dá um caldo de creosote quente. A mãe tem a sua iniciação no sub-mundo da droga dando um caldo de calda bordalesa. O cão, que ficara trancado no micro-ondas, com a fome, tenta roer um talo de couve tronchuda que a mãe deixara para o jantar.
O homem lava os vidros da frente com shampô especial para carros. Um cigano esporra-se nos ouvidos da avó enquanto lhe esfrega a placa dentária na cenaita. Um cigano que estava a cagar no meio da sala, espreitou pela janela e viu que o homem se aproximava. Debandaram todos, deixando a avó toda esporrada, o filho com uma seringa cheia de querosene com tinta da china espetada no pescoço. A mãe tenta retirar o garrafão de Sonasol Bilitrão do cú e o cão tosquiado de dentro da panela da feijoada.
O homem entrou, sentou-se nos sofá, ligou o televisor e adormeceu.



UM CONTO ANCIENT REGIME

N. A. - Transcrito do espólio em papel do Assento da Sanita e datado provavelmente de 1991. A qualidade literária está aquém da conseguida actualmente. No entanto já se nota a presença característica da pobreza de espírito mais confrangedora, da escatologia gratuita, dos padres, dos ciganos, dos elementos psicanalíticos baratos, da escrita merdosa e infantilóide, etc. Enfim… só para apreciadores.


O Senhor de Treville-sur-Loire saiu da liteira e limpou a lama dos pés a um camponês que disputava assanhadamente uma pele de coelho com um dos seus mastins. Deu um pontapé em Henri, o seu velho e fiel criado, quando este o foi ajudar a descer. Passou pela cozinha para insultar Charlote, a sua ama de leite e foi jantar. Os faisões tinham sido maltratados e seviciados pelo moço da cozinha antes de serem degolados pela cozinheira. O cravista atacou uma sonata de Telleman em estilo galante. Acenderam-se os candelabros. Nisto, o Abade Prevot entrou apressado na sala. Queixava-se a Treville, pois as partes naturais do seu moço de recados já andavam um bocado esgaçadas. Não havia problema. Treville agarrou num braço do cravista e mandou-o embrulhar para o Abade.
Olhou pela janela da mansão em direcção ao prado onde os servos e camponeses pastavam o restolho deixado pelas ovelhas. Adorava quadros pastoris.
À noite, enquanto dormia, sonhava que Deus Nosso Senhor o instruía na arte de dirigir os destinos da Gasconha.

DEUS – Sim senhor, assim é que é. És mesmo um bom cristão.

TREVILLE – Faz-se o que se pode.

DEUS – Assim é que eu gosto. Tens um lugar garantido aqui ao pé de Mim. Ó S. Lucas, chega-me aí o pedilúvio.

TREVILLE – Olarilas.

DEUS – O quê?

TREVILLE – Olarilas.

DEUS – Larilas? Quem, eu? Tu vê lá o que é que dizes aqui ao mangas, hã!?...

De repente, no sonho, Deus era o esteticista de Treville que lhe estava a tratar dos pés com um safa-calos.

DEUS – Já ouviu a última da Duquesa de Edimburgo? O menino nem faz ideia.

TREVILLE - Diz lá, ó roto de merda.

DEUS – Parece que anda a dormir com a camareira.

TREVILLE - Pois. O que ela precisava era dum homem que lhe empurrasse a tripalhada até ao cachaço.

DEUS – Perdão?

TREVILLE – Esquece, ó trailarilas.

A seguir aparece a mãe de Treville, que o apanhou em flagrante a olhar embevecido para as fezes que acabara de depositar no penico de esmalte.
MÃE DE TREVILLE – Louis! O que estás a fazer?!...

TREVILLE - Ó mãe não me bata!...

A mãe de Treville desanca-o brutalmente com um enorme crucifixo de madeira, enquanto o insulta:

MÃE DE TREVILLE – Meu monte de lixo! Minha criatura desgraçada e desprezível! …Meu impotente de merda!... Atrasado mental!...Quem me dera nunca ter ficado grávida de ti…Era melhor ter abortado!...Só me acontecem desgraças!...Gosto muito mais do teu irmão!...Nunca mais morres!...Podias ao menos, ter um cancro na cabeça!...

Treville acorda ofegante e coberto de suores frios e puxa freneticamente a campainha para chamar a criada. Depois de beber meia garrafa de conhaque lá se acalma e volta a adormecer. Agora Treville está nu da cintura para baixo, com um frango depenado numa das mãos, na Sala do Trono, com o Rei e toda a corte a olhar em silêncio.

TREVILLE – Eu…eu…estou aqui…assim. Bem, isto deve ser uma brincadeira. Mas eu não…pois. São coisas que…o meu botão das calças não…

O Rei atalhou com um ar sizudo.

REI – E o frango depenado, Treville?

Fez-se um longo silêncio. A corte continuava em silêncio de olhos cravados nele.

TREVILLE – Não sei bem como é que …ainda à bocado a minha mãe…Sim, foi a minha mãe que disse que …não fui eu, eu não estava, ela bateu-me com isto…eu não percebo lá muito, (…) eu não tenho culpa…

REI – Está consciente da profunda gravidade da situação em que coloca todo o Reino e sobretudo o Tesouro, o Episcopado e a Coroa?

TREVILLE – Se fosse possível,…se Vossa Alteza não se importasse…de me explicar o que é que eu…enfim, o que é que aconteceu que…acho que a culpa talvez não seja minha…não sei, estou um bocado…se calhar há aqui um engano…

O Rei ao ouvir as palavras de Treville esbugalhou os olhos, ficou vermelho e explodiu de cólera, aos gritos, enchendo Treville de gafanhotos.

REI – Engano!!?...Meu animal, a Bastilha é boa demais para ti, meu aborto da Natureza! Nem a puta da tua mãe gosta de ti!...Meu monte de excrementos de galinha fermentados!...Minha pústula!...Meu furúnculo …Meu, meu, meu…

Enquanto se lhe tolhiam, de raiva, as palavras, o Rei agarrou-se ao pescoço de Treville para o esganar. Agora o cenário mudava de repente e o Rei era um porco grande que lhe atafulhava chorume pela garganta abaixo, com a ajuda de um funil.
Acordou sufocado e outra vez coberto de suor. Abriu os olhos e esfregou-os para ver melhor. Um grupo de camponeses andrajosos armados de forquilhas e foices olhava para ele. Treville, surpreendido, perguntou-lhes o que queriam.

CAMPONÊS – Acabaram-se-nos os brioches.

TREVILLE – O quê? Entram-me pelo quarto adentro para me falarem de sexo? Broches?! Guardas! Socorro!...Acudam!...Au secours!...

Treville foi sodomizado barbaramente pelos trinta e oito camponeses, mas conseguiu-se escapulir por baixo das pernas de um deles e correu pelas escadas aos gritos.

TREVILLE – Socorro!...Acudam!...Enrrabaram o Senhor de Treville!

Os gritos ecoavam pelos campos a tal ponto que se ouviam no Mosteiro de St. Jean-Le Geans. Os padres saíram desvairados a correr para serem enrrabados também e atropelaram um bando de ciganos pelo caminho. Um enorme tumulto assoberbou toda a região que ficou a ferro-e-fôgo. O pânico espalhou-se por todo o país. Tomaram a Bastilha e decapitaram o Rei.


FIM